O Velho e a Praça

Estava lá, na praça da matriz, fazia dias, na mesma posição, sentado em um banco, próximo a uns pombos que o visitavam por visitar, ele não os alimentava, pensava consigo mesmo: “- Bichos nojentos e transmissores de doenças, isso é o que são”. Porém os pombos pareciam indiferentes a esta atitude, mesmo porque fazia parte do que não era dito: “- Coisas para eu guardar na cachola”.


Era um senhor de uns setenta anos, aparentando mais, tinha o rosto enrugado pelo esforço do tempo, manchado, com umas pintas cor de ferrugem, imberbe, e de olhar míope, o que lhe dava o aspecto de pessoa muito antiga. Estava sempre calado, sério, compenetrado, sisudo. Não cumprimentava ninguém, quando resmungava era pra si próprio e ninguém ouvia, era como se não existisse, ou melhor, como se não quisesse existir.


A praça era dessas de cidade do interior, circundava a igreja, tão velha quanto a cidade, de portas pesadas de madeira de lei e que agora ficavam permanentemente fechadas. Com seus banquinhos de madeira e árvores frondosas, em outros tempos cheia de casais e crianças a brincar, hoje estava abandonada, vazia, suja, com apenas alguns pedintes que não o incomodavam. Há muito tempo não se ouvia o sino da igreja, nem ao menos a homilia da missa, o pároco havia deixado a cidade.


Já tinha dois dias que ele não sentia mais aquela dor na altura do estomago, a boca permanecia seca, mas ele não parecia se importar, ele ficava lá sentado distante olhando a praça, olhando a igreja, olhando as próprias mãos. “-Mãos inúteis, Mãos inúteis, Mãos inúteis”, dizia baixinho. Sentia um misto de vontade de gritar isso - como um alerta para todos os jovens - mas não havia mais jovens ali, ao mesmo tempo tinha vontade de calar-se, de escutar somente o velho coração, fraco, impotente e solitário.


De repente, sem aviso, a dor, vindo do fundo do ser, a dor o fez lembrar Dela, sentiu o Seu perfume e o calor da Sua carne, ouviu Sua voz. Lembrou dos tempos idos, da felicidade, pensou em voz alta: ”- Deus meu, quanta espera! Estou aqui há quanto tempo? Anos? Meses? Dias?”.


Teve vontade de chorar, olhou a sua volta, ninguém parecia se importar. Pôs as mãos enrugadas no rosto e chorou, mas não tinha mais lágrimas, estava ali há muito tempo, sentiu o coração mais triste. A dor aumentou, o coração não resistiu e o pobre senhor caiu, sem vida. De seus olhos não desceu uma lágrima.

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